A culpada

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Nenhuma literatura está livre de ficção. E nem de verdade.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Sobre um péssimo investimento que pareceu-me boa ideia

O uísque acabou, mas meus medos e lembranças continuavam ocupando o grande e profundo vazio em que minha vida vagarosamente se transformou.
Na carteira, mais fotos 3 x 4 que dinheiro. E com aquela miséria, uma decisão a ser tomada: cachaça barata ou cigarros.
Que tolice, optei pelo segundo. Logo eu, que nem fumante sou...

Confesso ter sentido quase que um minuto inteiro de satisfação - o que parecia-me impossível naquele cenário - ao longo do primeiro cigarro, quando a pressão foi baixando devagar. E, sabe, teria valido a pena usar aquela odiosa droga se não fossem as lembranças...
Quanto mais amarelo o filtro ficava, mais eu lembrava o quanto odiava aquilo e o gosto daquela porcaria passava a fundir-se com o gosto do uísque, fazendo sentir a boca cada vez mais quente e abafada, e ficava impossível não lembrar-te:

Primeiro e obviamente, lembrei do teu gosto.
Acho que todos os que compartilham deste vício tem esse gosto nojento, então perguntei-me indignado "como pude um dia achar adorável (e até delicioso)?!". Mas, a vida sendo sacana como é, me fez aprofundar tal pensamento, e de repente vi-me, mais uma vez, ansiando pelos teus lábios tão gostosamente desgostosos e pelo teu sorriso nem tão branco, apesar de radiante. Desejei teu olhar caído e simultaneamente tão vivo, vivaz, e mortal.
O cheiro dos teus macios cabelos de shampoo misturado com tabaco era só o que eu queria sentir, e não o daquela fumaça cinza, fedorenta e imunda, que, em sua ausência, se resumia apenas a isso: uma fumaça cinza, fedorenta e imunda.

Percebi o devaneio e interrompi antes que fosse pior (mas isto pelo menos livrou-me de mais uns tragos). 
"Vou apagar essa merda", pensei alto.
E ao olhá-lo novamente só consegui desejar que estivesse com a marca do teu batom.

Aí a lágrima, uma única lágrima, desceu.

Foram os seis reais e cinquenta centavos mais mal gastos da minha vida.