A culpada

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Nenhuma literatura está livre de ficção. E nem de verdade.

terça-feira, 3 de junho de 2014

Lembra quando um dia, no carro, em frente ao meu portão, despediu-se com um beijo e logo em seguida convidou-me para assistir um filme qualquer dia?
Não achei que fosse verdade, mas disse que sim, e foi nesse momento em que apaixonei. 
E a cada dia, com cada gesto e palavra, o sentimento se confirmava e aprofundava. A cada sorriso largo e fechado, a cada ajeitada no chapéu que sempre estava ao contrário e a cada comentário risonho em meio às seriedades do dia-a-dia. 
A cada olhar reluzente, a cada declaração muda ou gritante, a cada beijo longo e forte e até mesmo com as tuas juras tão falsas de que todo cigarro seria o último. 
A cada vez que se sujava com a comida e cada vez que ria de mim quando eu fazia o mesmo. Cada vez que falava meu nome com receio quando achava que me chatearia, e a cada vez que me chateava e me fazia ameaça-lo pífiamente só pra dizer que não era boba.
Ao abraçar toda a tua causa e querer exterminar tudo o que lhe fazia derramar lágrimas tristes, pois me apaixonava a cada lágrima de alegria ou de emoção.
Me apaixonava quando demonstravas nobreza, ombridade, lealdade, humildade e uma bondade enorme que nem se sabia de onde vinha, e mais ainda quando alegrava-se da minha alegria e orgulhava-se na minha vitória. Me apaixonava por cada detalhe que sabia da sua vida, mesmo os condenáveis, pois era com essas pequenas coisas que eu entrava cada vez mais na sua história. Me apaixonava por toda flor que vinha de surpresa, por cada beijo ao acordar, por toda confiança que em mim parecia depositar.

Quem poderia dizer que hoje, quem tanto amei, é um completo estranho com os olhos entristecidos e com a cabeça sempre baixa ao se pronunciar? Que mal consegue aproximar-se e que conversa quase que monossilabicamente somente quando lhe é extremamente necessário?

O tempo às vezes é infeliz.
Da mesma forma que promove encontros, faz com que as pessoas, mesmo tendo sido um dia grandes confidentes, se tornem meros conhecidos cada vez mais desconhecidos.

Acho na verdade que o tempo não passa de um infeliz querendo deixar as pessoas que nem ele.

Ainda bem que não consegue com todos! Eu é que não tenho tempo pra essa tal infelicidade! Só tenho tempo pra me apaixonar por outros detalhes e fazer minha parte numa outra história.